Conjur confirma: Moro divulgou grampos ilegais
"Ao tornar públicas as gravações de telefonemas entre a 
presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o
 juiz federal Sergio Fernando Moro divulgou material ilegal. De acordo 
com professores de Direito e advogados ouvidos pela ConJur, os grampos não poderiam ter perdido o sigilo", diz o portal Conjur; juristas já falam até em "Morogate"
"Ao tornar públicas as gravações de telefonemas entre a 
presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o
 juiz federal Sergio Fernando Moro divulgou material ilegal. De acordo 
com professores de Direito e advogados ouvidos pela ConJur, os grampos não poderiam ter perdido o sigilo", diz o portal Conjur; juristas já falam até em "Morogate"
17 de Março de 2016 às 04:00
Do Conjur
Ao tornar públicas as 
gravações de telefonemas entre a presidente Dilma Rousseff e o 
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o juiz federal Sergio Fernando 
Moro divulgou material ilegal. De acordo com professores de Direito e 
advogados ouvidos pela ConJur, os grampos não poderiam ter perdido o sigilo, por dois motivos igualmente graves.
Primeiro, porque se um 
dos participantes da conversa tem prerrogativa de foro por função, 
caberia à primeira instância mandar as provas para a corte indicada. No 
caso, a presidente Dilma só pode ser processada e julgada (em casos de 
crimes comuns) pelo Supremo Tribunal Federal, conforme manda o artigo 
102, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal.
Ou seja, a única decisão 
que Moro poderia tomar a respeito da gravação seria enviá-la ao Supremo,
 para que lá fosse decidido o que fazer com essas provas: abrir 
inquérito, abrir ação penal, arquivar, devolver etc. De acordo com a 
explicação do professor de Processo Penal da USP Gustavo Badaró,
 agora que Moro abriu o sigilo sem questionar o Supremo, se houver 
qualquer indício de crime cometido pela presidente nas conversas, as 
gravações não poderão ser usadas.
Pedro Serrano,
 professor de Direito Constitucional da PUC de São Paulo, é mais direto.
 Para ele, não há interpretação da Constituição que permita a um juiz de
 primeiro grau tornar público material sem qualquer decisão do STF.
O advogado Cezar Roberto Bitencourt,
 professor de Direito Penal da PUC do Rio Grande do Sul, também afirma a
 ilegalidade da divulgação dos grampos. "No momento em que o telefone 
interceptado conecta-se com autoridade que  tem foro privilegiado, o 
juiz não pode dar-lhe publicidade", afirma.
Planos políticos
Na gravação, Dilma 
aparece dizendo que enviou a Lula um envelope com um papel, o termo de 
posse. Nesta quarta-feira (16/3) à tarde, Lula foi nomeado ministro da 
Casa Civil, o que foi inclusive divulgado em edição extra do Diário Oficial da União.
A tese da oposição é que Lula só foi nomeado ministro para “ganhar” o direito a prerrogativa de foro por função.
 Isso seria corroborado com a fala de Dilma a Lula dizendo que ele 
usasse o termo de posse caso necessário. Dilma afirmou ter dito aquilo 
porque o ex-presidente não havia dado certeza sobre se compareceria à 
cerimônia de posse no cargo, marcada para esta quinta-feira (17/3) às 
10h.
Outra autoridade com 
prerrogativa de foro no Supremo que aparece nas gravações divulgadas 
nesta quarta é Jacques Wagner, antecessor de Lula na Casa Civil e atual 
chefe de gabinete da presidente Dilma. Ele aparece reclamando de Claudio Lamachia, presidente do Conselho Federal da Ordem.
“Também é preciso ver os 
horários. Se Lula já estava ministro quando a conversa foi divulgada, a 
decisão foi ilegal”, completa Badaró. E se Lula não ainda não era 
ministro, Jacques Wagner era.
Relógio
O outro motivo é que, ao 
que tudo indica, as gravações das conversas foram ilegais, e Moro as 
divulgou sabendo disso. Pelo menos é o que mostram os horários em que os
 eventos foram publicados no site da Justiça Federal do Paraná.
Às 11h13 desta quarta-feira (16/3), Moro despachou
 que, como já haviam sido feitas “diligências ostensivas de busca e 
apreensão”, “não vislumbro mais razão para a continuidade da 
interceptação”. Por isso, ele determinou a interrupção das gravações.
Ato contínuo, informou à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal sobre o despacho. Às 11h44, Moro publicou uma certidão de que havia intimado por telefone o delegado da PF Luciano Flores de Lima a respeito da suspensão das gravações.
Entre 12h17 e 12h18, Moro enviou comunicados
 às operadoras de telecomunicações sobre a suspensão dos grampos. As 
interceptações são feitas, na verdade, pelas operadoras, a pedido da 
polícia, com autorização judicial. Portanto, uma hora depois da 
suspensão dos grampos, elas já estavam sabendo que não deveriam atender a
 nenhum pedido nesse sentido.
Só que a conversa em que 
Dilma avisa a Lula que ele vai receber o termo de posse como ministro da
 Casa Civil aconteceu às 13h32. A própria Polícia Federal foi quem 
contou isso ao juízo da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, onde 
corre a “lava jato” e as investigações sobre Lula.  Em comunicado 
enviado à vara às 15h34, o delegado Luciano Flores conta a Moro sobre o 
conteúdo.
Por volta de uma hora depois, às 16h21, Moro determina o levantamento do sigilo do processo inteiro, dando ao público acesso a tudo o que está nos autos, inclusive a gravação da conversa entre Dilma e Lula.
“Na melhor das hipóteses,
 o juiz foi imprudente”, comenta Badaró. “Se havia um despacho dele 
mesmo mandando cessar as interceptações, qualquer gravação feita depois 
disso é ilegal.”
Já para Cezar Bitencourt,
 "houve, no mínimo, má-fé". "Essa gravação, após encerrada a autorização
 judicial, é uma interceptação ilegal, e a sua divulgação também é 
ilegal, pois feita com a consciência de que se tratava de uma gravação 
ilegal. Houve crime de quebra de sigilo telefônico ilegalmente. Houve 
também falta administrativa, que deverá ser apurada pelo CNJ."
Sigilo obrigatório
O criminalista Alberto Zacharias Toron
 concorda. Ele lembra que o artigo 8º da Lei 9.296/1996, a Lei das 
Interceptações, é clara em dizer que os grampos telefônicos e suas 
respectivas transcrições são sigilosas. Já o artigo 10 diz que 
“constitui crime”, com pena de dois a quatro anos de prisão, quebrar 
segredo da Justiça, conforme lembra o advogado Marcelo Leal de Lima Oliveira, do Eduardo Antônio Lucho Ferrão Advogados Associados.
“Ainda que o juiz queira 
abrir o sigilo do inquérito, jamais poderia tê-lo feito em relação às 
interceptações. Essa divulgação me parece marcada por flagrante 
ilegalidade”, afirma o Toron. “É muito espúrio que um juiz divulgue isso
 para causar comoção popular. É mais uma prova de que o juiz busca 
aceitação popular, de que ele busca sua legitimação no movimento 
popular. Sua aceitação não vem da aplicação da lei, vem da mobilização 
do povo, o que é muito característico do fascismo, não do Estado 
Democrático de Direito.”
Morogate
O professor de Processo Penal Lenio Streck
 acredita que se pode chamar o caso de “Morogate”. É uma referência ao 
caso das escutas ambientais instaladas numa reunião do Partido 
Democrata, nos Estados Unidos, a mando do então presidente, Richar 
Nixon. O episódio ficou conhecido como Watergate, em homenagem ao hotel 
em que as escutas foram instaladas, e resultou na renúncia de Nixon.
“Imaginemos que, para 
pegar um presidente, sejam feitos vários grampos envolvendo pessoas que o
 cercam, como a secretária executiva. A vingar a tese de Moro de que não
 há mais sigilo [em conversas envolvendo autoridades, desde que elas não tenham sido diretamente grampeadas],
 todos os segredos da República poderiam ser divulgados. Uma cadeia de 
contatos que exporiam todo tipo de assunto que o Presidente da República
 falasse com pessoas sem foro”, analisa Lenio. “Quem examinar esse fato à
 luz da democracia, dirá: Moro foi longe demais.”
Já Daniel Gerber,
 também do escritório Lucho Ferrão Advogados, afirma que, no caso da 
presidente, o levantamento do sigilo é ainda pior, pois suas conversas 
podem envolver assuntos estratégicos para o país.  “Isto jamais poderia 
ser desvelado por um juiz, principalmente, sendo um de primeira 
instância” finaliza.
Apoio a Moro
O presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamachia, comemorou a decisão de Moro. Segundo ele, a sociedade tem o direito de ter acesso a todas as informações.
“A OAB tem cobrado o fim 
do sigilo desses processos. O Direito Constitucional à informação 
precisa ser garantido nesse momento turbulento da história do país. As 
pessoas precisam ter condições de saber como decidir o que fazer, como 
opinar”, afirmou, em nota. Lamachia também pediu acesso aos depoimentos 
dados pelo senador Delcídio Amaral na “lava jato”, o que ainda estava 
sob sigilo na época. Queria acesso aos documentos para instruir um 
pedido de impeachment da presidente Dilma.
A Associação dos Juízes Federais do Brasil
 (Ajufe) também manifestou apoio a Moro. Em nota, disse que “as decisões
 tomadas pelo magistrado federal no curso deste processo foram 
fundamentadas e embasadas por indícios e provas técnicas de autoria e 
materialidade, em consonância com a legislação penal e a Constituição 
Federal, sempre respeitando o Estado de Direito”.
“No exercício de suas 
atribuições constitucionais, o juiz federal Sérgio Moro tem demonstrado 
equilíbrio e senso de justiça”, conclui a nota.
Ao explicar a decisão em que levantou o sigilo,
 o juiz federal Sergio Fernando Moro diz que não há qualquer defesa de 
intimidade ou interesse social "que justifiquem a manutenção do segredo 
em relação a elementos probatórios relacionados à investigação de crimes
 contra a Administração Pública".
*Texto alterado à 1h08 do dia 17/3 de 2016 para acréscimo de informações.




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